Coluna: Colhendo sonhos

Coluna Inversa

Por Larissa rocha

Colhendo sonhos

“A única coisa que separa as mulheres negras de qualquer outra pessoa é a oportunidade”, disse a atriz estadunidense, Viola Davis, em seu discurso quando se tornou a primeira mulher negra a ganhar o prêmio Emmy de melhor atriz de série dramática, em 2015. Ela também citou a linha invisível que separa as ‘castas’ ditadas pela sociedade e que atravessa muitos artistas.

Nós, crias do ‘nordimins’ sabemos bem o esforço necessário para atravessar a linha invisível  que separa as Minas das Gerais que, para muitas pessoas, só existe no nome. Ainda assim, nossas garotas brejeiras, têm ganhado o mundo das artes em geral.

Uma dessas mulheres excepcionalmente talentosas é a piraporense Kenia Freedom que, recentemente, teve o privilégio de se apresentar no monumento de grandes artistas mineiros: o Museu Clube da Esquina, em Belo Horizonte. O espaço funciona de terça a domingo, com ambiente diversificado, exposição permanente, passeios turísticos e o bar, onde os visitantes podem se encantar com a história desse que é um dos maiores movimentos da música mineira.

“Pra mim foi uma experiência maravilhosa. Sempre fui fã do Milton, do Lô Borges, do Beto Guedes... Cantar ali foi tocar de perto as histórias que me inspiram. Eu, uma nortemineira do interior, levar minha música, a música que eu gosto e que representa as barrancas do Velho Chico. Senti que posso ter meu sonho realizado, que não é impossível — basta querer”, contou a artista piraporense.

E como “sonho que se sonha junto, se torna realidade”, foi por meio de sua rede de contatos e apoio que Freedom realizou esse sonho. O produtor musical Ivan Chagas mediou esse encontro de gigantes, conectando Kenia ao Museu e a uma das suas maiores referências musicais, o cantor Beto Guedes.

Obviamente, “o show foi apreciado por todos presentes e deixa lugar garantido para um repeteco quando a diva retornar a BH. Também conseguimos visitar o restaurante onde Beto Guedes almoça regularmente. E num é que ela quase teve um ataque, quando viu o cantor? Apresentei ela ao Beto e, rapidamente, ele seguiu para a mesa (extremamente reservado, sem espaço para qualquer conversa). E a Kênia ficou ‘passada’!”

Como bem lembrou Ivan, a emoção de conhecer nossas referências é um momento marcante na vida de qualquer pessoa. Esses acontecimentos alimentam nossa esperança e nos faz sentir mais perto de viver cada sonho, cada história imaginada, cada arte e cada costume... Essa força estranha que faz de nós, pessoas comuns, grandes artistas.

Entre a travessia do rio e o palco da capital, Kênia reafirma o que é ser artista do interior: alguém que canta com os pés fincados na terra e os olhos voltados para o horizonte. Generosa, assim como os grandes artistas que admira, ela compartilha seu conhecimento musical muito além dos palcos da vida e devolve o sonho que vive à sua comunidade — conduz oficinas, orienta novos talentos e oferece, com graciosidade, um espaço de cura e acolhimento através da música.

O Estúdio Musical Freedom é referência no atendimento às crianças neuroatípicas e com dificuldade de aprendizagem, na formação de musicalidade para educadores e cantores iniciantes de todas as idades. É como ter um canto e um colo pra debulhar a vontade de ser um cantor ou cantora, como ela e tantas outras referências.

Com vivências como o Coral Estúdio Freedom e as mostras de talentos, a professora Kênia nos proporciona o contato direto com os palcos, com o público, com a construção de repertório e postura para se apresentar a diversos públicos, seja em eventos culturais, particulares, coorporativos ou bares.

Posso dizer que me vejo nesse sonho, faço parte da realidade que ele se torna. Acolhida por Kênia, pude dar lugar pra pequena Larissa, a menina bagunceira, espoleta, bailarina, brincalhona e arteira. A menina que via a vida com esperança. Fazer aula de canto no estúdio Freedom, fortaleceu minha autoestima em um momento da vida que eu realmente precisava de apoio. Ali eu pude cantar minhas dores, chorar e sorrir meus amores e sonhar com um mundo melhor e mais colorido de arte.

Salve a nossa cultura!

Salve os espaços que nos conectam com o belo, o divino e o maravilhoso.

Axé!

Fotos: Ivan Chagas e acervo pessoal Kênia Freedom

Discurso Viola Davis: https://youtu.be/OSpQfvd_zkE

Bar do Museu Clube da Esquina: https://www.instagram.com/bardomuseuclubedaesquina/

Matéria Crias do Nordimins: https://opiraporanews.blogspot.com/2025/09/coluna-nos-crias-do-nordimins.html

Larissa Rocha é cria de Buritizeiro/MG – um município gigante em território e em belezas naturais. Comunicadora apaixonada pelas histórias que nascem das barrancas do São Francisco, é destemida e curiosa. Atua na criação de projetos sociais e culturais, produção de conteúdo e gestão de redes sociais. Tem experiência em jornalismo impresso, comunicação institucional e marketing de conteúdo, sempre buscando unir afeto, estratégia e criatividade para fortalecer comunidades e valorizar as potências do Norte de Minas.

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